domingo, 9 de dezembro de 2012

NOVAS MESAS DIRETORAS DOS LEGISLATIVOS: QUAL SUA EXPECTATIVA?


Brasil afora essa é a realidade das eleições das mesas diretoras dos parlamentos, salvo as eleições nas duas casas do Congresso, cuja disputa, embora também seja influenciada pelo Planalto, se dá num patamar mais próximo do que elaborou o Barão de Montesquieu, já que, ali, a força do executivo não é hegemônica. Sempre participei da vida política e partidária e nessa condição sempre estranhei a naturalidade com que muitos, inclusive "bons" formadores de opinião, encaram essa deturpação do sistema tripartite do poder. Agora, na condição de vereador eleito de Fortaleza, vejo com mais nitidez a pobreza desse debate em torno da eleição do parlamento mirim. E não é só da parte dos, digamos assim, principais agentes dessa disputa (os vereadores). De fato, estabeleceu-se na seara política do Ceará uma lógica perversa, alimentada por segmentos da política, da imprensa, do eleitorado e até de intelectuais, de determinação do fim da disputa situação-oposição, que reflete diretamente na eleição das mesas diretoras. Por esse discurso do fisiologismo todos têm que ser situação. Tudo começa no dia seguinte ao anúncio do resultado do pleito, ocorra esse sob o manto da legitimidade ou não, quando o prefeito "eleito" ou eleito anuncia, com o aplauso acrítico dos segmentos a que me referi linhas atrás, que governará com todos, vale dizer, trabalhará para não ter oposição. Quem ousar rezar fora dessa cartilha receberá, no mínimo, a pecha de mal-educado. O beija-mão ao "novo poder" vem de tudo que é lado. Até mesmo de muitos daqueles que, constatando o fato na linha das pertinentes achegas dos que responderam a ENQUETE do POVO de hoje (destaco o texto do professor FRANCISCO MOREIRA RIBEIRO), estranham e denunciam essa deturpação do processo legislativo, essa subjugação de um poder pelo outro, porém a estimulam e aplaudem quando também, contraditoriamente, reproduzem o discurso da naturalidade da interferência e do adesismo. As mais das vezes até cobram dos que, como já o disse, não se ajoelham a essa lógica do situacionismo. E ainda tem quem, fantasmagoricamente, sustente que isso não existe, mesmo assistindo, lendo, ouvindo, todo dia o noticiário político... Os vereadores, claro, que não resistem a esse canto da sereia, colocando na mão e no desejo do "prefeito eleito" a decisão, são os maiores responsáveis por essa diminuição do seu papel e do relevante papel do legislativo.

ENQUETE
Novas mesas diretoras dos Legislativos: qual sua expectativa?As mesas diretoras da Câmara de Fortaleza e
da Assembleia Legislativa do Ceará terão nova composição em 2013. O que esperar das futuras lideranças?
    
FRANCISCO MOREIRA RIBEIRO
Prof. de Ciência Política da Unifor

Toda e qualquer mudança ocorrida em qualquer esfera do poder sempre gera algum tipo de expectativa positiva por parte da sociedade. No entanto, o termo “mudança”, muito desgastado pelo uso impróprio e pela dimensão que lhe é atribuído, não tem correspondido à expectativa por esta gerada, em especial quando relativa ao Poder Legislativo. A cada pleito surgem novos atores, tem-se a falsa impressão de que algo de “novo” está sendo gestado. A cultura política local, marcada por um continuísmo massacrante, não possibilita que transformações significativas ocorram no interior das máquinas legislativas, seja ela municipal ou estadual. As negociações de bastidores para a eleição dos futuros presidentes e das mesas diretoras indicam que as mudanças ficarão apenas no perfil de alguns atores, mas o enredo e o espetáculo continuarão os mesmos. Não se pode falar em mudança de poder quando estes continuam subjugados e manietados pelo Executivo.

CARLA MICHELE QUARESMA
Cientista política

No momento de formação das mesas diretoras da Assembleia Legislativa do Estado e da Câmara Municipal de Fortaleza, lembro-me do Barão de Montesquieu, quando o mesmo defendeu o princípio da tripartição do poder com o argumento de que só o “poder limita o poder”. A autonomia das instâncias é condição para que haja, a contento, a fiscalização imperiosa em uma República. Que as mesas contemplem a heterogeneidade que as urnas estabeleceram na composição das casas e estejam atentas aos anseios sociais, garantindo uma gestão transparente, voltada às discussões dos grandes problemas enfrentados pela população e, sobretudo, que avancem no sentido de oportunizar uma efetiva participação da sociedade nos processos legislativos, tornando os seus atos cada vez mais públicos e incorporando os juízos individuais em um processo coletivo de tomada de decisões.

VALMIR LOPES
Cientista político e professor da Universidade Federal do Ceará
O ruim pode sempre piorar. A teoria da divisão dos poderes nasceu para evitar a tirania, criando pesos e contrapesos de modo a impedir a concentração de forças políticas. O pensamento liberal foi o criador dessa ideia, mas a prática institucional demonstra a tendência à invasão de prerrogativas de um poder sobre o outro. Essa tendência institucional agrava-se atualmente pela conjugação do situacionismo político. É o que vemos nos últimos anos no funcionamento dessas duas instituições, até a sociedade civil entregou-se ao governismo. É triste uma sociedade não reconhecer o valor do debate democrático e preferir a concordância e a subordinação. A marca recente da política no Ceará tem sido o acentuado situacionismo político, chegando a ser maior do que no período autoritário. O situacionismo e o alinhamento de forças políticas gera o paradoxo do totalitarismo democrático. Que falta nos faz o pensamento liberal!

CLÉSIO ARRUDA
Doutor em Sociologia

Movimentos políticos, nas duas últimas décadas, instituíram a democracia nacional. O voto livre e secreto, as manifestações públicas e o direito de associação para fins políticos estão assegurados. Indivíduos e grupos têm liberdade para desejarem e possuem disposições (partidos políticos, sindicatos e associações) para empreenderem esforços em busca de alcançarem as coisas desejadas, como trabalho, melhores salários, saúde, educação e casa própria. Conquistamos nossa democracia, mas ainda precisamos efetivar os princípios republicanos, que significa fazer as instituições funcionarem com autonomia. Isto é obstaculizado quando os Executivos Municipal e Estadual avançam sobre os Legislativos, ao influírem decisivamente na formação de suas mesas diretoras; assim, inibindo o contraponto, a fiscalização e o controle de suas ações. Eis a bandeira política necessária: democracia republicana já!

CARLOS MAZZA
Repórter do Núcleo de Conjuntura do O POVO

Acesas na “ressaca” do pós-eleições, as conversas sobre a formação das mesas diretoras do Legislativo costumam ficar à margem do debate político. Nas conversas de pé de ouvido e no jogo de interesses que permeia a disputa, tudo fica na cozinha da Câmara e da Assembleia. Em péssimo exemplo de transparência, até a imprensa sofre para colher informações. A impressão que fica é de que as decisões tomadas na cúpula do Legislativo dizem respeito só aos deputados e vereadores. Conclusão mais falaciosa não há. É ali, na mão de poucos entre poucos, que reside o controle da agenda do Executivo e o poder para mudar a cidade e o Estado. Essa “consideração” com o povo, aliada aos pífios desempenhos na criação de leis e fiscalização do Executivo, ajuda a explicar a falta de interesse dos cidadãos na disputa e as altas taxas de renovação do Legislativo a cada eleição. Para as novas mesas que assumem ano que vem uma súplica: mais transparência, por favor.

PEDRO JORGE MOURÃO
Mestre em Sociologia

Podemos esperar mais do mesmo. O que esperar de 10 homens que foram escolhidos sem que a maioria da população pudesse dizer um “aí”? O servente, o flanelinha do shopping, o homem do Paratodos, o professor e até os mais jovens sabem inconscientemente o que esperar. Os sonhos dos políticos são os pesadelos do povo. Na Assembleia, o governo conseguiu o apoio da maioria dos deputados, o que dificulta muito uma oposição aos caprichos de Cid Gomes. Com relação à Câmara Municipal, podemos esperar quase a mesma coisa que vem da mesa da Assembleia. Exceto alguns vereadores mais ingênuos (e por isso mesmo corajosos) podem nos surpreender. Mas só se não caírem no canto de sereia do governo... E os poucos que sobrarem de pé, serão devorados na sobremesa do palácio da “escravidão” do Estado. Como já dizia o pensador: Muitas vezes é a falta de caráter que decide uma partida. Não se faz literatura, política e futebol com bons sentimentos.

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