Da infância pobre para o comando do principal tribunal do país
Joaquim Barbosa:
filho de pedreiro e faxineira assume a presidência do STF
Publicado: 22/11/12 - 8h00
Novidade no
Supremo. Barbosa ao lado de Lula, na solenidade de nomeação ao STF, por
indicação do próprio ex-presidente, que buscava um negro para um cargo
representativo Jamil Bittar/Reuters/7-5-2003
BRASÍLIA — Joca, um dos oito filhos de
um pedreiro que deixou Paracatu, Minas Gerais, para tentar a sorte em Brasília,
no início da década de 1970, assume hoje, às 15h, a presidência do Supremo
Tribunal Federal (STF). Joca era o apelido de infância do ministro Joaquim
Benedito Barbosa Gomes, de 58 anos, o primeiro negro a comandar a mais alta
Corte do país. Implacável na condenação dos réus do mensalão e, às vezes,
incisivo na forma de lidar com outros ministros, Barbosa assume gerando a
expectativa de inaugurar uma nova fase no Judiciário
Barbosa chegou ao STF em 2003 por
indicação do ex-presidente Lula. O presidente queria um negro para um cargo tão
representativo e escolheu Barbosa, até ali um pouco conhecido procurador da
República no Rio. Barbosa teve, então, que mostrar que a cor da pele poderia
ter sido um ponto de partida, mas não o fator determinante na escolha. Ele
tinha atrás de si uma carreira e notório saber jurídico, tal qual os demais
colegas da Corte.
Em 2006, ainda um novato no STF,
Barbosa deu mostras da independência e da firmeza que marcariam sua trajetória
de juiz. Diante da desconfiança de alguns, o ministro acolheu quase na íntegra
a denúncia do ex-procurador Antônio Fernando de Souza contra 40 réus do
mensalão, entre eles o ex-ministro José Dirceu e o ex-deputado José Genoino,
dois ex-dirigentes do PT, partido que viabilizara a chegada dele ao tribunal.
Mas as surpresas não param por aí.
Barbosa conduziu com mãos de ferro o
processo e acabou produzindo um relatório final considerado mais contundente e
mais consistente que a denúncia do procurador-geral. Avesso a firulas,
atropelou a resistência do revisor Ricardo Lewandowski a aspectos do relatório,
ignorou arestas com o ministro Gilmar Mendes e, numa costura política com o
ex-presidente Ayres Britto, conseguiu a condenação de 25 dos 40 réus, inclusive
dos petistas.
Transmitido pela TV Justiça e com ampla
cobertura da imprensa, o julgamento confirmou que Barbosa é mesmo direto no
trato com os colegas. Nada muito diferente da assertividade que ele revelou nas
votações de outros projetos importantes, que acabaram sendo aprovados pelo STF
depois de acaloradas discussões.
— Ele foi muito duro (no julgamento do
mensalão). Mas não podemos deixar de dizer que a atuação dele é coerente com
tudo o que ele foi ao longo da vida. Ele sempre foi assim sério, cara fechada.
Ele foi do Ministério Público e sempre expôs o que pensa. Ele é assim — resume
Antônio Carlos de Almeida Castro, o Kakay, advogado de Duda Mendonça, um dos
réus do mensalão.
Barbosa marcou pontos importantes
também na aprovação da Lei da Ficha Limpa, na permissão para pesquisas com
células-tronco, e na união entre pessoas do mesmo sexo. Hoje, Barbosa é o juiz
mais conhecido no país. Ele já negou que tenha intenção de fazer carreira
política. Antes de se tornar celebridade, teve que percorrer longo caminho,
marcado por disciplina, estudo e superação.
Negro, pobre e migrante, desembarcou em
Brasília no início dos conturbados anos 1970 com um objetivo muito claro: fugir
da pobreza e da irrelevância, sina reservada a milhares de outros jovens de
mesma origem social. E foi o que ele fez. Depois de alguns bicos, foi chamado
para trabalhar como digitador na gráfica do Senado.
Não era um grande emprego, mas ele não
tinha escolha. O jovem Barbosa trabalhava das 18h às 4h da madrugada digitando
textos para o “Jornal do Senado”, que, às 7h, já deveria estar sendo entregue
no Senadinho, no Rio. Neste período, passou no vestibular para Direito, na
Universidade de Brasília, e teve que se desdobrar para se manter na faculdade e
no trabalho. Segundo antigos colegas, algumas vezes, Barbosa dormia na oficina
porque não sobrava tempo para voltar para casa.
— Ele era compenetrado, muito atento no
serviço. Era um dos melhores digitadores. Escrevia rápido e quase não cometia
erros. Não nos dava nenhum trabalho — derrama-se o ex-coordenador de Produção
Mário César Pinheiro Maia, chefe de Barbosa na gráfica e ainda hoje amigo do
ministro.
Maia também era técnico do Photon, o
time da gráfica em que Barbosa jogava como ponta-esquerda:
— Ele gostava de driblar, não soltava a
bola. Era fominha, mas jogava bem.
Maia e outros amigos dos tempos de
gráfica foram convidados para a posse de Barbosa, ou Quinca, como ele era
conhecido no Senado.
— Quando ele não estava trabalhando,
estava estudando. Teve uma vida sofrida, mas era bom menino — lembra José de
Lourdes, parceiro de Barbosa em longas madrugadas de trabalho.
Quase sempre calado, Barbosa não
aceitava provocação. Segundo Lourdes, certa vez, um colega faixa preta em judô
fez uma brincadeira de mau gosto. Barbosa rasgou um palavrão e exigiu que o
lutador se retratasse. Assim, impôs respeito.
Na UnB, Barbosa teve uma passagem
discreta. No período, os estudantes estavam divididos entre progressistas, que
queriam derrubar a ditadura militar, e conservadores, alinhados com o regime.
Segundo o ex-reitor da UnB José Geraldo de Sousa, contemporâneo de faculdade do
ministro, Barbosa era um reformista, queria mudar o sistema, mas dentro das
regras estabelecidas:
— Era um período difícil. Os estudantes
começaram a ser organizar com a criação do Centro Acadêmico e
com o Escritório
Modelo de Advocacia. Ele fazia parte das discussões, mas não me lembro de ter
integrado a direção.
Para ele, naquele período Barbosa
estava mais concentrado nos estudos do que no movimento estudantil. Ainda na
UnB, Barbosa passou no concurso para oficial de chancelaria do Itamaraty. A
partir daí, a carreira deslanchou. Foi procurador jurídico do Ministério da
Saúde, fez mestrado, doutorado e passou no concurso do Ministério Público
Federal. Aprendeu a falar francês, inglês e alemão.
Em 2003, quando Lula procurava por um
negro para indicar ao STF, Barbosa já tinha o currículo recheado de referências
nacionais e internacionais. Mas a escolha não foi fácil. O advogado Kakay
afirma que marcou um encontro de Barbosa com o então ministro José Dirceu, num
restaurante. Logo depois, o ex-ministro da Justiça Márcio Thomaz Bastos entrou
no circuito e ajudou a assegurar a indicação do então procurador da República
para o STF. A rede de apoios não impediu que, nove anos depois, Barbosa levasse
o julgamento do mensalão às últimas consequências.
A trajetória também foi marcada por
desavenças públicas com colegas do tribunal. O ministro discutiu abertamente
com Marco Aurélio, Gilmar Mendes e Ricardo Lewandowski. Também teve entreveros
com o ex-ministro Cezar Peluso.
Uma das primeiras discussões que
Barbosa protagonizou no tribunal foi com Marco Aurélio, em 2004. Barbosa
criticou o colega, que tinha autorizado, por liminar, uma mulher a abortar um
feto com anencefalia. Barbosa disse que a decisão era muito polêmica para Marco
Aurélio tomar sozinho. O colega ficou irritado e disse que, se estivesse na
Idade Média, resolveria a pendenga com um duelo fora do tribunal.
Outra briga famosa foi quando Peluso
sugeriu que o colega era inseguro. Barbosa respondeu, em entrevista ao GLOBO,
que o ministro era “desleal, caipira e tirano”. Em 2009, Barbosa disse, em
discussão acirrada no plenário, que Gilmar Mendes estava “destruindo a
credibilidade da Justiça brasileira”. A Corte quis divulgar uma nota de repúdio
à fala de Barbosa. Lewandowski se recusou a assinar o texto, obrigando os
colegas a mudar de posição.
Hoje, o ministro mais próximo de
Barbosa é Luiz Fux, que inclusive já o acompanhou a uma consulta médica no Rio,
para tratamento de seu problema crônico nos quadris. Mas os dois não são íntimos.
Os amigos de Barbosa estão no Rio, onde ele morou por muitos anos. Na capital
fluminense também mora o filho, Felipe, jornalista de 26 anos. Barbosa tem um
apartamento no Leblon. A mãe, Benedita, ex-faxineira de 70 anos, mora em
Brasília, bem como os sete irmãos e os sobrinhos do ministro. O pai, Joaquim,
morreu há dois anos.
4 comentários:
O Ministro Joaquim Barbosa é um homem integro, cujo os ensinamentos de seus pais durante a infância perduram até os dias atuais, sem serem deturpados pela a ambição de poder. Este realmente honra pai e mãe, além da dignidade de sua cor de afro-descentendes, não citarei a palavra raça, pois para mim quem tem raça são animais. Parabéns Ministro Joaquim Barbosa.
que bosta que dizer que o ministrro joaquim barbosa bateu na sua mulher e quase deixou de ser ministro por isso? como ele vai fazer quando for julgar pela lei maria da penha?
Fenômenos que ocorrem por geração espontânea: racismo, homofobia, transfobia, sexismo, machismo, misoginia, maus tratos a animais, fascismo, corrupção e canalhice.
Nem sempre a origem humilde significa bons princípios. Veja o atual prefeito de Boa Viagem que em pouco mais de 8 anos no poder já é ficha suja e vive perseguindo funcionários. Quem viu ele empurrando um fusquinha pra ver o que ele ostenta hoje, só se tiver ganhado na mega-sena. Mas um dia a casa cai juntamente com a da irmã de simples professora a empresária rica com salário de professora. Eita família de princípios e milagrosa.
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