POLÍTICA 14/03/2013
A dimensão política da escolha por um controvertido papa
Bergoglio cobrou que a Argentina parasse de "rezar" para o FMI. "Não vamos a lugar nenhum, simplesmente nos endividaríamos ainda mais"
Dificilmente os sacerdotes reunidos na Capela Sistina poderiam fazer opção mais política, em diversas e até contraditórias dimensões. Agora papa Francisco, Jorge Mario Bergoglio é provavelmente o cardeal mais envolvido em polêmicas deste mundo na atualidade, a ponto de comprar embates públicos com o governo argentino. Em questões comportamentais, é conservador – como praticamente todos os membros do conclave –mas tido como moderado, o que já representa avanço na direção progressista em relação a seus dois antecessores. É contra casamento gay, aborto, eutanásia, coisas do tipo. Por outro lado, é crítico das desigualdades, defende políticas sociais e de ajuda aos pobres, e combate políticas econômicas ortodoxas e tidas como neoliberais. Mas é acusado de envolvimento com a ditadura militar no País e até de suposta cumplicidade em sequestro de jesuítas no período. Seu nome é citado em diversos processos. Chegou ainda a emitir mensagens de “reconciliação” e “arrependimento” em apoio a recentes movimentos a favor da anistia para agentes do regime acusados de crime no período ditatorial. Quem convive com ele, por outro lado, menciona sua humildade e timidez, além do fato de ser normalmente calado. Anda de ônibus em Buenos Aires e cozinha a própria comida, por exemplo. Além disso, ficou famoso o episódio no qual lavou e beijou os pés de doentes de aids, ao repetir gesto bíblico. E teria sido sua própria rejeição à ideia de ser papa a responsável pela derrota no conclave que elegeu Bento XVI, em 2005, quando, segundo os relatos, ele foi o segundo colocado. Naquela época, ele era considerado a “oposição” moderada ao conservadorismo de Joseph Ratzinger.
Os embates políticos confrontaram-no com a própria Santa Sé, quando a nomeação de bispos argentinos, em 2006, passou por cima da cúpula da Igreja no País, supostamente por influência do à época secretário de Estado do Vaticano, Angelo Sodano, e o cardeal colombiano Adolfo Trujillo. Conforme noticiou à época o jornal Clarin, ambos eram considerados excessivamente conservadores pelo clero argentino – já tido como um dos mais retrógrados do mundo.
Outra dimensão política da escolha é, evidentemente, o fato de ser o primeiro papa não-europeu em quase 1,3 mil anos. E, sobretudo, um pontífice do Terceiro Mundo, latino-americano. Em 14 de fevereiro, a coluna já destacava que o eurocentrismo não condizia com a realidade da Igreja, muito menos o colégio de eleitores. Calcula-se que quase metade dos católicos do mundo vive no continente americano. Contudo, só a Itália tinha 21 cardeais com direito a voto no conclave – mais que os 19 de toda a América Latina. A escolha de Francisco pode sinalizar ao menos o início da adequação desse eixo de poder à realidade da base da fé cristã.
A VISÃO ECONÔMICA DO PONTÍFICE
Um dos aspectos mais interessantes da atuação política de Bergoglio é sua oposição às políticas econômicas adotadas na Argentina, sobretudo durante a aguda crise da virada do século. Em 2001, ele disse que “há pobres perseguidos por pedir trabalho e ricos que fogem da Justiça. Gente que chora pela violência e gente que joga comida fora”. Um ano mais tarde, cobrou que o País parasse de “rezar” para o Fundo Monetário Internacional (FMI). “Não vamos a lugar nenhum, simplesmente nos endividaríamos ainda mais”, afirmou.
“GUERRA SANTA” CONTRA CASAMENTO GAY E GOVERNOS DOS KIRCHNER
Com os governos de Néstor e, mais tarde, Cristina Kirchner, o agora papa travou abertas guerras políticas. A ponto de o ex-presidente ter até mesmo transferido a tradicional missa de ação de graças pelo aniversário da Argentina da catedral de Buenos Aires para a cidade de Santiago del Estero. O principal conflito foi relacionado à lei que passou a permitir casamento entre pessoas do mesmo sexo, definida por ele como “movimento do demônio”, contra a qual moveu “guerra de Deus”. Por outro lado, Bergoglio ressalta, também, a importância do respeito aos homossexuais - o que, nessa matéria, já o coloca em posição mais avançada que o da maioria de seus pares.
De modo que, com sua escolha, a Igreja emite sinais diversos: não deverá haver mudança em relação ao casamento gay ou aborto, mas há expectativa de aprofundamento do trabalho social da Igreja e do engajamento na luta contra as desigualdades. Já em relação à ruptura com o eurocentrismo e à aproximação com os países subdesenvolvidos, convém aguardar para observar se a Santa Sé irá além da mera simbologia da escolha por um sul-americano
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2 comentários:
Na minha opinião, acho isso um espetáculo besta. Em vez de gastar saliva e fortuna para eleger e sustentar um papa, deviam acabar com os conflitos no oriente médio e a fome nos paises miseráveis.
É MUITA IGNORANCIA QUERER QUE SEJA O PAPA QUE ACABE COM OS CONFLITOS DO ORIENTE MÉDIO SE OS CONFLITOS NUM SÃO NEM COM OS CATÓLICOS E A MISERIA DO MUNDO? IMBECILIDADE.
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