segunda-feira, 12 de setembro de 2011

R$ 27.852.989,08

O POVO dá as cifras do desfalque nas verbas que (não) iam para obras do Dnit-CE. O caso completou um ano e a fase de depoimentos de testemunhas à Justiça já começou. A partir de hoje, numa série especial, você terá noção de como foi desviado, segundo a CGU, o dinheiro público que deveria manter nossas estradas.
Até então, era segredo o tamanho do rombo que engolia milhões de reais do Departamento Nacional de Infraestrutura de Transportes (Dnit) por fraudes nas obras das BRs cearenses. Não havia se falado das cifras com exatidão. O escândalo estourou em agosto de 2010, quando a Polícia Federal anunciou a chamada Operação Mão Dupla. Prendeu empreiteiros e mais 11 servidores, num esquema de corrupção que percorria diversos contratos do órgão. Agora, um ano depois, aparecem as medidas oficiais da cratera deixada nos cofres públicos.
 O desfalque, calculado pela Controladoria Geral da União por pagamento de serviços não comprovados e danos ao erário, chegou a R$ 27.852.989,08 (vinte e sete milhões, oitocentos e cinquenta e dois mil, novecentos e oitenta e nove reais e nove centavos). Ou, no mínimo, esse valor todo. Ainda há investigações em andamento na própria CGU, Polícia Federal e Ministério Público Federal. Nesse fosso, a CGU diz que R$ 13.056.626,96 sumiram em trabalhos não executados e outros R$ 14.796.362,12 deveriam ter sido cobrados em impostos às construtoras e aos personagens da história.

A Controladoria chegou ao número dissecando 17 contratos do Dnit postos em suspeição. Os relatórios foram trabalhados a partir de julho de 2010 e concluídos em fevereiro deste ano. Os R$ 27,8 milhões dados como desviados, representam 9,78% do total desses contratos, que somados chegavam a R$ 284.788.136,73. Os serviços, os mais diversos, foram, seriam ou estavam sendo executados nas BRs 222, 226, 020, 116, 304 e na ponte que liga a Praia do Futuro à Sabiaguaba. Os contratos não haviam sido pagos integralmente. Tão logo a Operação Mão Dupla foi anunciada, a Justiça Federal reteve repasses pendentes.

O POVO obteve, com exclusividade, relatórios da CGU que dimensionam a rede de propinas e rotinas ilícitas que teriam sido praticadas diariamente entre construtoras, fiscais e engenheiros do Dnit, e que envolviam inclusive a própria cúpula do órgão federal. São descrições das investigações policiais e dos documentos da Controladoria. Os documentos são de fevereiro último e assinados por Alexandre Landim Filho, chefe substituto da Controladoria Regional da União no Ceará.

Pelo que dizem CGU e PF, havia um dia-a-dia de relação estreita entre as partes denunciadas, para além do que estava nos contratos públicos: construtoras que supostamente se locupletavam e presenteavam a contento pelo menos oito servidores, suas mulheres, filhos(as) e até amores clandestinos. São 22 pessoas e mais nove empresas processadas, em uma ação cível (de improbidade administrativa) e outra penal. Tramitam, respectivamente, na 1ª e 11ª Varas da Justiça Federal. Mas as duas histórias se entrelaçam o tempo inteiro.

Presentes e amantes

A investigação sustentou que firmas contratadas bancavam o aluguel e abastecimento de veículos para quem fosse importante ao esquema dentro do Dnit. Havia despesa regular nas construtoras para isso, anotada em cadernos e agendas de secretárias. Os empreiteiros também custeavam hotéis e passagens aéreas, para fiscais, supervisores, seus familiares ou amadas clandestinas, ou mesmo almoços de cortesia. Tudo entrou na contabilidade do escândalo, segundo a CGU. As provas também aparecem em vasto material apreendido nas residências dos acusados, em escritórios das construtoras e em interceptações telefônicas autorizadas judicialmente.
 Entre as constatações na inspeção da CGU, os relatórios apontam: “medição de serviços não executados, beneficiando a empresa (...) com o valor de R$ 2.629.386,10”; “evolução patrimonial incompatível...”; “superfaturamento”; “venda de placas de sinalização a empresas contratadas pelo Dnit-CE, por intermédio de empresa aberta em nome do filho do fiscal do contrato”; “direcionamento de resultado de processo licitatório”. No total, foram 93 irregularidades listadas nos 17 contratos. Só um dos contratos teve 11 ilicitudes apontadas.

A quantia milionária e as constatações exuberantes da fraude sinalizam o porquê de tantos buracos nas BRs cearenses, à época em que o caso veio à tona. Há cerca de quatro meses, o próprio governador Cid Gomes, comprou briga com o então ministro dos Transportes, Alfredo Nascimento. Reclamou publicamente que as estradas federais do Nordeste só apareciam ruins no território cearense. A presidente Dilma Rousseff, já após dispensar o ministro, deu razão a Cid.

O QUÊ

ENTENDA A NOTÍCIA

Há um ano, servidores do Dnit-CE e pessoas ligadas a construtoras foram presas na Operação Mão Dupla. À época, a PF agiu em sete Estados, executou 52 mandados de busca e apreensão, 26 de prisão temporária e uma de prisão preventiva. Naqueles dias, as “provas robustas” ainda apontavam desvio de R$ 5 milhões, cinco vezes e meia menor que o cálculo do desfalque, feito pela CGU.
Cláudio Ribeiro
claudioribeiro@opovo.com.br

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