sábado, 25 de abril de 2009

60 ANOS DE DIGNIDADE. ROSA. ROSA FONSECA.


Prestamos nossa merecida homenagem à uma guerreira da luta do povo. Rosa Fonseca, exemplo de resistência e dignidade na luta em defesa da liberdade e da emancipação da humanidade.

O texto abaixo transcrito é do Dimitri Tulio - Jornal O POVO de hoje:


Tempo
A vitalidade da Rosa que não murcha
Rosa da Fonseca chega aos 60 anos. "De repente" a ex-presa política virou personagem da história do Ceará. Militante do Crítica Radical, ela afirma que se sente aos 19 anos

Demitri Túlio


Uma das propostas de lugar para a entrevista com Rosa da Fonseca provoca risos e aciona a simpatia da incansável militante que, aos 60 anos, não se enquadra mais no rótulo de esquerda ou qualquer traço “convencional” de se fazer política. Queria levá-la ao shopping Del Passeo, um dos templos “fetichistas” do capitalismo contemporâneo em Fortaleza. Comer algo no MacDonald’s, conversar principalmente sobre sua vida pessoal e bater pernas no caminho das vitrines e desejos. Deslocá-la. A idéia era tirá-la do espaço corriqueiro onde foi construída sua imagem de sempre disponível para qualquer “luta que emancipe um coletivo”.

- Você sabe, nunca fui ao Del Passeo. - Nunca?! - Nunca. Então foi ela quem sugeriu o canto de seu prazer em Fortaleza. Um quintal do casarão onde viveu o “padeiro espiritual” Eduardo Sabóia, entre o Centro e o Jacareacanga. Na rua onde quase ninguém ouviu falar da Confederação do Equador e o que fez um padre chamado Mororó para virar notório e placa de esquina. Sim, nos fundos do terreiro de pés-de-sapoti e mangueiras, ela me avisa que ali morou o histórico comunista Jáder de Carvalho, genro de Eduardo Sabóia.

“Antigos e novos revolucionários acabaram se encontrando nesse espaço. Pra você ver a história, né!”, ri para o destino. No bangalô antigo, onde hoje convive cada dom Quixote do Movimento Crítica Radical, encontramos um generoso caldinho de feijão quente, Célia Zanetti de guerra e o pensador Jorge Paiva. Pares diletos de Rosa da Fonseca que concorrem, em bem querer, com as seis irmãs, dois irmãos e uma récua de sobrinhos que descendem do padeiro português Manoel Rodrigues Fonseca e sua Maria Rocilda de Quixadá.

Rosa teria puxado mais à mãe Rocilda, falecida em 2001. Herdado parte da memória entrançada do DNA revolucionário de uma mulher do Sertão Central nos anos 40 e 50.

“Em Quixadá, mamãe foi a primeira mulher a andar de bicicleta. Um presente do papai, quando eles ainda eram namorados. As bicicletas ainda existem”, conta. Dona Rocilda, por Rosa da Fonseca, não refugava uma boa luta para apoiar político que “considerava correto”. Na contramão dos costumes femininos da época e das leis senso comum do semiárido nordestino, a dona de casa bradava em comícios por suas apostas de um sertão diferente.

Seu Manoel Rodrigues, orgulha-se Rosa, não reprovava a disposição da mulher. Além disso, a esposa inquieta organizava quermesses para ajudar a construir igrejas e auxiliar a paróquia. Saía na carroceria dos caminhões pelos interiores com uma turma de amigas a arrecadar prendas, capote, jumento, carneiro, pato, galinha...

“O povo acha graça porque eu, na história das finanças do grupo (Crítica Radical e outros movimentos), sempre estou na linha de frente. Ora, desde pequena estou nisso. Via a mamãe fazer!”, conta. Aos 60 anos, a ex-presa e perseguida política da Ditadura Militar de 64/85, encontra na mãe também as raízes de sua briga pela garantia dos direitos das mulheres ou, na atualização do discurso, pela “emancipação feminina” em meio a um “capitalismo fracassado”. Nas lembranças de Rosa, a mãe não era de esperar apenas pelo trabalho e lucro do “respeitoso e solidário” Manoel Rodrigues. Havia no quintal da casa em Quixadá “umas vaquinhas” de dar leite para vender na vizinhança e ajudar nas despesas. Tinha ainda uma amizade “transacional” de dona Rocilda com uma freira alemã que trouxe da Europa, um dia, uma máquina desnatadeira de fazer manteiga e nata. A vida pragmática da mãe acabou por “incutir essa história de independência na cabeça da gente. Tanto é que todas nós (ela e as seis irmãs) estudamos e procuramos desenvolver uma atividade de trabalho para não depender de homem. Todas casaram e tiveram filhos, menos eu (risos)”, brinca Rosa . Amores? Existiram sim para lhe conversar “casamento”. Mas segundo a ex-vereadora pelo PSB (1992/1996), os que passaram por sua vida passarinho não entenderiam - lá na frente - que Rosa não caberia em estruturas fechadas como a do matrimônio.

“Antes de chegar nessa hora, eu voava. Fugia (risos). Fui noiva, inclusive, quando vim de Quixadá para Fortaleza. Durante esses anos, desenvolvi quase que uma defesa a qualquer coisa de querer me prender, me dominar, me submeter “, diz. “De repente”, diz Rosa, os 60 anos bateram à porta. Em meio a tanta militância e desejo de ver um mundo mais “humano”, a radical não se diz presa a qualquer tempo.

Sente-se aos 19 anos, estreando na luta, vinda de Quixadá. Ao tempo, ela poderia retrucá-lo feito Nana Caymmi: “Respondo que ele aprisiona, eu liberto. Que ele adormece as paixões, eu desperto. E o tempo se rói com inveja de mim, me vigia querendo aprender como eu morro de amor. Pra tentar reviver, no fundo é uma eterna criança que não soube amadurecer. Eu posso, ele não vai poder me esquecer...”

E MAIS - Rosa da Fonseca não quer ganhar nenhum presente especial. Foi o que disse aos familiares e amigos. No momento, seu desejo é quitar uma dívida "grande" feita, por necessidade, do Crítica Radical. O casarão, sede do grupo, foi dado como garantia do empréstimo. "Qualquer quantia doada vale como presente", dá a dica. - Além de Rosa, seus irmãos Manoel Fonseca e Fátima Ferreira foram presos na época da Ditadura. Rosa era integrante da Ação Popular. Ela é a sexta filha de nove irmãos - Elizabete, Luciano (falecido), Lúcia Helena, Plácida Regina, Teresa Cristina, Maria Imaculada e Isabel Cristina. - Apesar de ter sido presa e torturada em 1971, Rosa optou por não requerer a indenização que os governos (estadual e federal) pagam a ex-presos políticos. "Não há como compensar, em dinheiro, a tortura, uma morte ou um desaparecimento", afirma. - A festa dos 60 anos de Rosa da Fonseca, aberta ao público, ocorrerá a partir das 19 horas de hoje na avenida da Universidade, nº 2158. Vizinho ao Teatro Universitário.

PERFIL Nome: Rosa Maria Ferreira da Fonseca Nascimento: 24/04/1949 em Quixadá. Formação: Curso normal pedagógico. Sociologia e mestrado em Educação (UFC) Vida política: Foi diretora do DCE/UFC que funcionava clandestinamente na época da Ditadura Militar (64/85); após participar de um debate na TV com o então ministro da Educação, Jarbas Passarinho, em 1971, foi presa (2 anos e 2 meses) e torturada; participou da fundação do Movimento Feminino Pela Anistia, da União das Mulheres Cearenses (1979), da Associação dos Sociólogos do Estado do Ceará e CUT, da qual integrou a Direção Nacional e Estadual; foi do PT, PSB e PSTU; foi vereadora entre 1992/96; professora do município de Fortaleza, participou da fundação do Sintece e do Sindiute. Hoje: Ao lado de Maria Luíza Fontenele, ex-prefeita de Fortaleza, Jorge Paiva, Célia Zanetti e outros militantes, fundou o Crítica Radical. Grupo que rompeu com a política e as práticas de partidos e entidades que querem administrar a crise de um "sistema capitalista fracassado".

A emancipação humana é a busca. Atualmente empenhada na preparação do Fórum Transnacional Antifetichista que se realizar em Fortaleza (janeiro 2010), na campanha pela libertação do preso político italiano Cesare Battisti.


4 comentários:

Alfredo Carlos ! disse...

Tive o imenso prazer de conhecer Rosa da Fonseca, em plena praça do Ferreira centro de Fortaleza. Era uma manifestação por melhores salários dos Educadores da época. O ano era 1982, ano de eleições no País inteiro, Rosa estava candidata a Deputada Federal por um partido de esquerda, que não recordo agora, qual era. Pude ver a coragem, a bravura da mulher Cearense, sua garra era imensa. O discurso firme, atualizado, sua defesa pela classe era cabal, todos a entendiam e aplaudiam bem. Foi essa mesma Rosa da Fonseca que em 1971 ao assistir uma palestra do Ministro da Educação Coronel Jarbas Passarinho, foi presa covardemente, por ordem do próprio Ministro, por apenas discordar dele na hora da abertura dos debates. Rosa discordou da política pública empregada na época por Passarinho, ele não gostou e a moça foi presa e passou 2 anos na prisão. Ela só tinha 22 anos na época, vejam a coragem de nossa pequena heroína, peitar um ministro de Estado em plena ditadura. Parabéns Rosa, você é uma rosa de pessoa.

ZILDA MARINHO disse...

São muitas as vezes que me surpreendo comigo mesma.E é ai que descubro que tenho um coração para o bem. É quando sinto este mesmo coração pulsar de alegria quando lí esta linda história da trajetória de vida da brava guerreia, vitóriosa,Heroína.Heroina sim.Com H maiúscolo.A grande Rosa Fonseca.Mulher essa,que há anos passados a conheci através de fotos políticas,que para mim não passava de mais uma que, com sua belesa exterior, queria conquistar os votos do povo cearense.Só hoje atrvés deste maravilhoso espaço do Blogger da Liberdade é que tomei conhecimento da bravura dessa gerreira,vitoriosa e Heroina.Heroina,sim. Com H maiúscolo.Com certeza não são poucas as vezes, que ela deita sua cabeça no travesseiro e dar grandes gargalhadas por dois motivos:pelas as derrotas e pela a bravura e ousadia de ir a luta pelos seus objetivo sem temer a própria morte!!!!Essa sertaneja arretada, como dizem os baianos,faz questão de falar em seu berço quixadaense onde nasceu.Quanta honra e quanta glória no coração dessa grande majestade... o que eu mais queria hoje era segurar a mão dessa grande mulher e dizer:missão cumprida!!!Grande Guerreira....

Anônimo disse...

Faz gosto um ser humano ler isso. Neste muito de hoje com tantas coisas inúteis e supérfulas sendo valorizadas saber que existe pessoas que sabe valorizar as pequenas coisas que realmente são importante.

Acredito que o Dr. Deodato também tem um pouco da "Luta" da Rosa da Fonseca nas veias quando se indigna com todo tipo de Injustiça.

Anônimo disse...

Saudades do pessoal do Ceará... Rosa, inclusive! Antonio Baracat - Belo Horizonte